A delicadeza de existir

O tempo mudou de rotação. A vida pirou completamente e eu, que antes era meio louca, agora me vejo quase sã num mundo de loucos medicados e outros (sem remédio?) senhores de verdades únicas e absolutas.

Cansei! Cansei pra valer. Alguns chamam de depressão, outros de preguiça, falta de vergonha na cara, a medicina arruma mil nomes de doença e nada disso me parece real, nada disso me parece minimamente perto de ser verdade. Já passei por depressão algumas vezes e percebo uma diferença abismal. Ultimamente, a pouca tristeza que me permeia é externa e vem dos barulhos do mundo lá fora. Aqui dentro, vivo de remoer uma ou outra frustração, mas elas quase não falam. Aqui dentro há mil crenças, zilhões de sentimentos calados, abraços não dados, corridas não feitas. Há respirações profundas, paciência e auto perdão sendo cultivados como sementinhas recém plantadas.

A mente, volta e meia, sai pra passear. Fica vagando por horas ou minutos, assiste mil coisas que aos poucos vai liberando. Minha mente fugiu de casa por não aguentar o peso da realidade, por não saber conviver com todas as regras e necessidades da vida capitalista moderna, pela total incompetência em competir com meus iguais.

O corpo dói. Às vezes uma dor  suportável, onde risos e trabalhos conseguem existir e se sobrepor, em outras, a dor é tanta que anestesia a existência e me carrega pra um mundo do qual não lembro.

Viver é simples, a gente é que complica tudo com ilusões variadas e competições mesquinhas e muito bobas. A maior parte do tempo, consigo rir dessas bobagens sérias da vida cotidiana, outros tempos, sou contagiada e fico ácida, arredia.

Respiro.

 

Enlouquecimentos Cotidianos

Apagaram a luz.
Agora os monstros criaram asas [e vida] e passeiam livres ao meu redor.

Tateio em busca do abajour que não acende. Convivo.

Sei que não vão me machucar. Passeiam por aqui enquanto as gatas miam, incomodadas e prontas pra se defender. Todas a minha volta. “Eles” não nos farão mal.

Pernas, pés e braços entorpecidos, dormentes. Durmo, não bebo e rezo. São apenas medos…

Resta-me acender a luz e eles somem, escondem-se em algum canto escuro [que não sei] dentro de mim.

Ficarão lá, morrendo de inanição a cada sorriso, a cada amor, movimento, abraço.

Por um tempo, trocaremos de lugar. Eu passeio livre enquanto eles olham, até a próxima lua, tempestade ou escuridão.

Por hoje, convivo.

Terráqueos

terraqueos

Parente, crente, amigo…

dançam na frente de meus olhos ao sabor do tempo.

todos velhos conhecidos, em rostos um pouco diferentes.

para todos, existo num limbo esquecido, de momento

alguns, desejam presença, ouvido, concordâncias

[conveniências]

Indispostos, ocupados, ausentes

(ou apenas irritados)

semi deuses enfurnados em umbigos

cegos sedentos de…felicidade [?]

pisoteiam o que não convêm

fazem de invisíveis os derrotados.

inflados de de asco, repúdio e raiva

de qualquer dor

[que não seja sua]

 

Entre_linhas

entrelinhas2

Nos aproximam letras que traduzem sensações
 
Sentimentos em palavras que nos chamam
 
Como ímãs.
 
Absolutamente nada é dito as claras
 
Nada objetivamente declarado
 
Percebemo-nos interessados
 
Dançamos em nossas letras, 
 
Imaginamos intenções
 
Descortinamos entrelinhas.
 
Desnudamo-nos. Conhecemo-nos.
 
Nos aproximamos.
 
Passo então a respirar tuas linhas
 
Suspiro letras,
 
Aspiro palavras… Minhas.
 
Anseio encontros, linhas,
 
Aspas, ideias, possibilidades…
 
Reticências…
 
São nossas, tão nossas entrelinhas
 
Que nos permitem mundos
De realidades e sonhos
 
Que nos permeiam aproximações
 
Respeito, ambiguidades, carinhos
 
Cumplicidades, leituras próprias
 
Só nossas…de nós dois.
 
Onde outros imaginam,
 
Temos certeza. Velada, quieta
 
Sorriso de canto,
 
Espera sorrateira
 
Vinho a espreita.
 
Sorvemo-nos
 
Entre_linhas.
 

Nostalgia

Ciclos

No frigir desses dias, em que cuidamos para não pisar em ovos quase todo o tempo…
No frigir desse tempo…tão corrido, tão frio, distante…sem tempo.
Relações vão-se perdendo com a simplicidade de nuvens que passam,
Desafetos vão sendo construídos e fortificados pelas ilusões que nem sabemos de onde vieram.
Meus olhos enxergam pessoas, mas já não consigo sentir ninguém.
Meus ouvidos ouvem disparates, pseudo-verdades inventadas sei lá de onde, desafetos plantados ao vento, desalentos.
Pensar que ainda ontem, haviam abraços, sorrisos sem pedir, pequenos cuidados propagando amor. Havia alguém ali…
Sei que me perdi, mas às vezes, no frigir das horas…tenho saudade do som dos risos…

Quando dobram os sinos

Sinos_da_igreja

Desde que me lembro, existe por perto de onde resido, uma Igreja. Não que eu saiba disso por ser católica [minhas idas à Igreja escassearam lá pelos 15, quando parei de fazer promessas de não cortar o cabelo para poder passar de ano ou simplesmente conseguir viver em paz com meus pais]. E só hoje, virando a curva dos 4.0, é que me dei conta…

Parece haver algum mistério no som dos sinos, além de me lembrarem das horas, do tempo escoando… Lá atrás, a Igreja era um refúgio, uma espécie de última tentativa desesperada de encontrar alguma luz, uma saída ainda não percebida [não raro, sinto-me cega, perdida mesmo, para as coisas aparentemente naturais dessa vida cada vez mais antinatural] e, mesmo sem conseguir nada das missas, que naquele tempo eram ministradas por padres idosos e quase sempre estrangeiros, eu conseguia encontrar alguma trégua para a escuridão. Colocar-me de joelhos, fazer as preces que o catecismo me ensinou e tentar, entre lágrimas e dor, comunicar-me com Deus [ou ao menos, abrir uma fresta de sintonia com o universo].

Agora, quando as ânsias e necessidades tornaram-se bem mais urgentes para a sobrevivência e a correria de tudo quase me ensurdece, torno a ouvir esses badalos. Por vezes mini canções…outras tantas, um alerta das horas que se estenderam pelo dia. Faz um tempo, acordo antes das seis, acordo antes do sol e com isso, passei a respeitar os sinos que dão bom dia, que ainda hoje, a despeito da minha total indisciplina religiosa, me alcançam… Hoje, soam-me como resposta de Deus, um convite musical para que eu não me afaste muito… para que eu faça uso do seu lampião aceso e ilumine meus escuros…

Agradecida por ser ouvida, fecho os olhos em prece silenciosa…

Mutações

A alegria na tristeza - Martha Medeiros

Trago por dentro essa mania obsessiva de ficar tricotando dores.
Faço das vivências dolorosas, minha linha
e de pessoas envolvidas, agulhas.
Vou tecendo tapetes de amargura
nos quais, desejo pisar em cima.
Colchas de retalhos que espero doar aos ventos para que levem pra longe.
Quando já não puder me lembrar de algumas coisas, desejo que esses tapetes sejam os primeiros esquecimentos.
Que a vida-terra, transmute toda tristeza e dor em flor e beleza ao longo do caminho.
Porque mudar rumos internos, é preciso.

Perdas e Ganhos

“Nem sempre o que resta é o resto”

– Clarissa Corrêa –

Segredos guardados na Alma

Voltei. Estive fora e já nem lembro por quanto tempo. Posso imaginar que foram os últimos 3 anos, mas a verdade é que parece que já faz muito, muito mais que isso…

Os ciclos  esquisitos  vão se repetindo e, quando “acordo” (?) lá estou novamente enfiada no buraco negro particular. Ao contrário do que pregam os novos tempos, sou uma alma introspectiva, dessas que volta e meia tem um caso de amor com a solidão. Seria ótimo se não fosse o detalhe de ser humana e, como todos, ter períodos abismais de carência. Esse sim, o mal do século! Deste e de qualquer outro, por sinal.

A montanha russa da vida, esteve mais para roda gigante nos últimos tempos, dada a sua lentidão. Uma benção, sem dúvida. Por outro lado, o trem da vida passou e nem vi, tão ocupada estava, vendo nuvens.

No buraco negro que me habita, há um passado inteirinho de perdas e carências. Olhando agora, com mais calma, penso que alimentei demais as tais perdas e não olhei muito os ganhos… De alguma forma, pareciam apenas o fluir natural da vida. Agora, rola uma gratidão grande por cada ganho que, no fim das contas passa longe de ser detalhe. Ao contrário do que sentia, parece que os ganhos eram meus alicerces, eram o que faziam de mim, porto seguro ao invés de navio. Passado…

Diante dos meus medos, enxugando as lágrimas que ainda são muitas, fica uma vontade giga de atropelá-los, passar por cima destes trastes metidos a besta e fazer o que pode ser feito no momento. Impulso. No rompante da dor, a vontade é ir lá e sair correndo daqui. Mudar. Sair do ciclo de masoquismo em que me coloquei, romper mais alguns vínculos que pareciam paraíso, mas eram apenas jogos de quem ainda tem a soberba de usar a vida do outro pra brincar. Deve ser digno, de algum modo… Particularmente, não sei, nunca aprendi essa dança das cadeiras um tanto macabra. Felizmente!

Estou em cheque. Mate-me, por favor! O jogo acabou e eu deixei de ser engraçada. Deadline. Pra variar, estiquei tanto a linha que ela arrebentou. Caí. Agora só me resta levantar, me ajeitar e sair andando. Ainda que chore, ainda que doa. Passará mais rápido se eu estiver em movimento.

No momento, o que resta, passa muito ao largo de ser resto.

Crenças, mudanças e circunstâncias

“Às vezes, o poeta ouve a harmonia das palavras

– outras vezes, só ouve o “batecum gererê”

-Manoel de Barros –

crenças

Até ontem, acreditava em estrelas. Acreditava em pessoas capazes de um amor só – abnegado e crescente -. Acreditava no poder da lua, do mar, do sol…na cura pela natureza. Até ontem, acreditava em amizades infindas, em pessoas boas de verdade e com quase nenhuma maldade escondida.

Até ontem, tinha certezas inabaláveis, acreditava nos brilhos dos olhos, na vontade de acertar, acreditava nos outros [primeiro de muitos erros] até mais do que em mim. Sim, também aprendi a duvidar, inclusive, das “certezas”, contudo, ainda assim, teimava em acreditar.

Acreditava no poder do pensamento forte, nas respostas as orações feitas com alma, na energia das cores, na evolução das vivências e no saber misterioso inserido nos erros aparentes. Acreditava em posturas boas, em silêncios ricos e sábios…acreditava no tempo, que melhora [?] tudo.

Pode parecer ridículo pra você que lê, mas eu cheguei até aqui com esse “q” de crença e esperança. Até ontem…

Ontem, a casa foi levada pela enchente. Vi meus pertences externos irem embora por entre meus dedos e percebi que tudo quanto eu havia levado uns anos para ter e manter, havia sumido como se tivesse existido apenas na minha mente, criação da minha ilusão romântica de pessoa mediana que anseia por sobreviver com algum conforto.

Vi minhas crenças mais profundas afundarem junto com o fiapo de esperança por uma vida melhor, mais saudável. Foi-se…tudo, tudo… E, ao que parece, restei eu, um corpo solitário e um tanto oco [não fosse por esse tanto de água que me inunda]. Tive crise de riso, achei graça dessa sorte torta que a vida trouxe. Entendi o tal provérbio: “quem colhe vento, semeia tempestade”. A tempestade me engoliu. Se te parece que tenho pena de mim, engana-se, não tenho sentimento algum além de um certo vazio amargo, que se traduz mais em sabor do que em sentimento, não é verdade?

Hoje, a água que levou tudo, começou a secar, mas nem importa muito, porque agora o deserto é a maior parte do meu mundo. Não pode ser a toa esse calor todo…ainda devo suar, já que as lágrimas também secaram.

A vida começou ontem e parece que, de novo, terminou no fim do dia, antes que eu pudesse festejar o sonho virando realidade, antes que eu me tornasse adulta e individualista, antes de fazer do mundo o meu umbigo, a água levou meu mundo…

Será que sobreviveremos [eu e meu umbigo] até a próxima tempestade? Será que morro de inanição antes do inverno ou será apenas isso: do pó ao pó?

Quem sabe…?

Frente & In_Verso

A preguiça da palavra
É o silêncio que me habita
São tantos os meus lados
Infindos os desejos
Excedentes as possibilidades

Fiz da rotina
Um roteiro de viagens
Dos amores
Meu livro de memórias

A cada história de amor que finda
Eu morro um pouco
Me mato
Para renascer mais linda.

A cada trabalho que termino
Me desconfiguro
Reinvento,
Me refaço.

Detesto mudanças
Mas, não raro,
Permito-me brincar de algo novo.

Os muros me cansam
Não curto escaladas
Talvez daí
Meu fascínio por aviões…

Grandes alturas
Distâncias imensas, rapidez…

Desconheço linearidades
Ser uma é muito e pouco
Desde criança sou muitas
E sempre muito singular.

Trago no Re_Verso
A menina, a puta
A poderosa, louca
E a santa.

Tenho sonhos de mulher
E conquistas que qualquer homem quereria

Queimei meus gritos na fogueira
Nas inquisições da vida.

Hoje, reverbero nas palavras
Letras de prosa e verso
A afirmação da minha
Doce e Dura
Existência.

RE_VISITA

Trago um sonho em meus olhos
Que presumem meus sentidos

Tão idôneo
Se não olho para os versos
É que vendo-os
– Disperso –

Mesmo vendo a ti, meu ouro
Que como cobre
Me encobre de viço
Durante a passagem do teu voo.

Sabes que de contorcer a palavra
Perdemo-nos em  linhas
Para reencontrarmo-nos em horizontais
Entrelinhas de esfinges decifradas.

Li tantas esferas em poesia, reunidas
Dádiva de promessa esquecida

Não te esquece
Há muito me conheces
E de mim não duvidas
Te dou uma, duas ou três cismas

Unge-me ao fósforo semblante que te principia
Aliás é distante
É de bem antes essa espera infanticida
Não te mates, delícia que me tens…
Eu, a mesma de antes
Você, antes, agora e durante…
A mediar novos prólogos em profecia
Destas tantas escritas que traçamos aqui.

Qualquer coisa que se SINTA

“Il y a toujours quelque chose d´absent qui me tourment”*

Quero da vida todos os amores
Todas as intensidades
Todas as vontades satisfeitas.

Quero de mim mesma algo grande
Do outro, algo de belo
Instigante, insinuante
Inusitado
Intenso
Espelhado.

Quero. Tenho. Preciso. Pressinto.

Sinto?

Sei lá… Tantas vezes, esse muito que me consome vira um mar de nada, de lava, de algo que abandona. Me detona até a raiz dos pêlos, esfria a pele, congela o mundo, enfeia.

A vida é bela, as coisas lindas, pessoas cheias de algo… nem sempre bom. E tomo meus tapas na cara e cuspo os dentes fora, me despeço de mundos feios, tranco portas de caminhos que não me interessam. Digo adeus e no adeus me ganho de volta. Mesmo machucada, com outras marcas, um olhar ainda mais apurado e muito menos doçura para doar, sigo. Inteira.

Aprendi antes de nascer que o SER é coração e que ele SENTE. Confundi SER com qualquer “gente”, pessoa, humano. Me enganei. O SER SENTE, mas nem todo ser humano faz o mesmo. O mundo superlotou e nos habituamos a viver com “pontes”, “latrinas”, “brinquedos” humanos. Desrespeitamo-nos!! Mudamos o olhar, já não olhamos para o outro, para o nosso umbigo e mal fazemos amigos inteiros. Nos habituamos com meios, com poucos, migalhas de nada e nos desvirtuamos da integridade do sentimento, do tal AMOR inteiro, do sentimento real e profundo de SER e do olhar generoso para o outro.

Vamos crescendo, correndo para a vida, ansiando coisas, perdendo o fôlego, perdendo a nós mesmos, deixando de SER e nos acostumamos a apenas existir enquanto usamos coisas e pessoas, fingimos sentimentos ilusórios, vendidos no câmbio negro ou em qualquer esquina de carência, como droga alucinógena. Verdades estranhas foram construídas por náufragos fracassados que se proliferaram e se misturaram aos SERES, dando vida a existência sem valor.

Coitados!

Dificilmente sentirão toda dor de um amor real acabado ou nem começado, as frustrações intensas e enlouquecedoras das preocupações com o outro que lhe seja caro e, com isso, também não sentirão amores intensos, eternizados pelo momento do suspiro de prazer do ser amado.

Por tudo isso e tanto nada, me acho, redescubro, penso, redefino vida. Por enquanto, eu SINTO, mesmo sem saber ao certo até quando… E você, sente?

*Existe sempre alguma coisa ausente que me atormenta.

Desculpa Se Te Chamo Amor

Porque, quando o vejo, o mundo faz mais sentido

Porque ao mesmo tempo, minhas certezas caem sem deixar vestígio.

Com ele, meus olhos finalmente brilham

E eu já não ligo tanto para rótulos e imposições

Simplesmente fui pega de surpresa.

Passei a sentir falta da presença

Ansiei pelo cheiro, pelo beijo, pelos olhos

Pelo toque, pelo abraço, pelo enredo.

O que temos em comum? Desejos.

Por que nos encantamos tanto?

Parecemo-nos. Somos confiantes,

Seguros, arrogantes, simplórios

Amantes.

Se ele me ama? Não sei.

Nunca perguntei.

Importa o bem que ele me faz.

E como faz!

É meu pronome de posse

Meu sorriso mais largo

Meu olhar mais bonito

Ele é a confusão dos meus sentidos

Dos meus sentimentos

Mas é também certeza,

Aquela, vigorosa, intensa,

Inteira.

Te desejo cúmplice no prazer

Na leveza de nos querermos

Aceitando, amando…

Erros, discordâncias, acertos.

Acordar ao seu lado

Deitada no corpo que me aconchega

Tendo em mim as mãos que aquecem

A respiração que acalma e excita…

Te ver ali, entregue, incrivelmente meu.

Exausto, tranquilo, faminto…

Não há rótulo para o que vivemos

Posso ser qualquer nome, desde que seja sua

E, dentro de mim, não há jeito, me desculpa,

Só te chamo Amor… MEU.